Minha filha esqueceu o celular em uma praça movimentada no fim da tarde. Já em casa deu por falta. Umas duas horas depois lembrou da praça. Voltou e… lá estava o celular no mesmo lugar onde sentara.
O alto falante do catamarã de Xingó anunciou: “alguem esqueceu um baton Nivea no pier”. Aracaju capital de Sergipe parece que não existe, não é desse mundo. Ou eu fui abduzido.
O cara deixou na mesa da praia o celular, mais a mochila com seus apetrechos e foi meditar na beira mar. Em nenhum momento se voltou pra conferir a mesa em pleno movimentado sabado de sol. Ficou ali em posiçao de ioga depois deu um mergulho. Eu observava. Ninguem se aproximou daquela mesa. Toda vez que me deparo com isso em uma capital nordestina de 650 mil habitantes aí tenho certeza de que esse lugar não é daqui. Ou eu não estou aqui.
O NORMAL
O irmao de uma amiga argentina havia acabado de chegar a Buenos Aires vindo de Roma, Italia. Trazia na bagagem um super equipamento fotografico que exibia orgulhoso. “Peguei de uns japoneses na praça”. O cara advogado, com grana, branco, vistoso, afanou os equipamentos de turistas japoneses na maior tranquilidade. “Eles podem comprar outro”.
Nos metrôs de Paris, meninas lindinhas são ladras. Sofri tentativa de roubo no hall de um hotel parisiense - o segurança agarrou o ladrão pela gola da camiseta Lacoste e o expulsou do lugar.
São Paulo é uma tensão andar pela Paulista, pela 25, por qualquer lugar. O Rio igual. Salvador, cada vez pior. Então é estranho estar em um lugar sem medo de ser repentinamente afanado. Tem algo muito errado com Aracaju, uma certa loucura, uma anormalidade, essa tal de gente honesta e educada.
TRÊS SÓIS
Proxima a Aju tem Nossa Senhora da Gloria, a cidade do escuro. As casas, as lojas, farmacias, clinicas, igrejas, oficinas, mercados jamais acendem as luzes internas durante o dia. Todas funcionam no escuro. A justificativa é que a cidade tem três sois por pessoa. O sol é tao forte que ilumina os ambientes mesmo com as janelas fechadas. Além disso, o escuro ajuda a reduzir o calor e o povo acostumou as vistas, assim feito gato, feito morcego. Na cidade vizinha a cultura muda e todos acendem suas luzes. Ufa!
Quatro horas de viagem de van depois tem Xingó - agua entre as pedras. Aí a gente confirma que esse lugar cercado de agreste e sertão, com três sois por pessoa, não é mesmo desse mundo. Xingó com seu mar de agua doce do Rio Sao Francisco é um escândalo. Os canions são partes que o universo liberou para mostrar que o nosso tamainho de gente é desse tamainho. O jeito é reverenciar, posição iogue do Sol, mãos para Tupã
e agradecer.
Ahô!
